segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

A música no jogo do ator


A música no jogo do ator
Béatrice Picon-Vallin

"Eu trabalho dez vezes mais facilmente com um ator que ama a música. É preciso habituar os atores à música desde a escola. Todos ficam contentes quando se utiliza uma música "para a atmosfera", mas raros são os que compreendem que a música é o melhor organizador do tempo em um espetáculo. O jogo do ator é, para falar de maneira figurada, seu duelo com o tempo. E aqui, a música é sua melhor aliada. Ela pode não ser ouvida, mas deve se fazer sentir. Sonho com um espetáculo ensaiado sobre uma música e representado sem música. Sem ela, - e com ela: pois o espetáculo, seus ritmos serão organizados de acordo com suas leis e cada intérprete a carregará em si" (1).

Assim exprime-se Meyerhold nos últimos anos de uma vida em que sempre considerou sua "educação musical como a base de (seu) trabalho de encenador" (2). Meyerhold aprendeu a tocar piano, e sobretudo violino. Chegou mesmo a hesitar em fazer uma carreira musical, e Chostakovich, em suas memórias, fala dos "remorsos" do grande encenador que, nos momentos mais sombrios dos anos 30, imaginava-se um pequeno violinista tocando seu instrumento com desvelo, em alguma parte da orquestra... (3) De uma grande cultura musical, Meyerhold podia tanto ler uma partitura quanto substituir o maestro de seu teatro ou sentar-se ao piano. É rodeado, ele e seu teatro, de compositores, Gnessin, Prokofiev, Chostakovitch, que tornaram-se célebres, ou de grandes intérpretes, Oborin, Sofronitski. A colaboração com estes compositores foi benéfica para ambas as partes, seja para as pesquisas de Meyerhold relativas à música no teatro, seja para os próprios compositores a quem Meyerhold dava impulsos criadores (conf. as óperas O amor das três laranjas de Prokofiev, ou O Nariz de Chostakovitch) e sobre cujas obras ele refletia ativamente, pensando em montá-las (4). Meyerhold fez igualmente de V. Chabalin (5) um muito interessante compositor de música teatral, através de um trabalho prolongado e rigoroso com ele (final dos anos 20 e anos 30), ao longo de sete espetáculos.

In Le jeu de l'actor chez Meyerhold et Vakhtangov, Laboratoires d'études theatrales de l'Université de Haute Bretagne, Études & Documents, T. III, Paris, 1989. Tradução de Roberto Mallet.

2 comentários:

Benone Lopes disse...

O que eu mais fico intrigado com a música e com o ritmo, é a maneira com que esses elementos atingem o nosso inconsciente produzindo significados que são quase inomináveis, mas que se apresentam em formas e movimentos assumidos pelo corpo. Outra maneira de se interpretar isso é que os movimentos gerado por aqueles estímulos também são parte do significado e não só o seu produto. De qualquer maneira ainda é intrigante e se pudéssemos mapear o que acontece nesse meio tempo entre ouvir e dançar, acredito que os atores ganhariam mais controle das suas memórias corporais.

Karina Figueredo disse...

Dancemos-nos!